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quarta-feira, 3 de março de 2010

269) A vida apenas...

Foto Lugoca



Chega um tempo em que não se diz mais:
meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.
Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.
Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões
dentro dos edifícios provam apenas
que a vida prossegue e nem todos
se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.

Carlos Drummond de Andrade





3 comentários:

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  3. Oi Lu,
    Tudo bem com vc? Comigo está tudo bem.
    Que texto bonito!! Aliás estou na ousadia dando "aquela expiadinha" no seu blog.

    Gostei muito do texto em que cita que a vida é sempre um aprendizado.E concordo com vc...não sabemos nada!!

    Estou tentando aprender, com tudo que ouço, vejo e vivo.E buscando sempre levar uma vida mais leve...

    Abraços Ana Paula


    Sinto pela sua mãe,força sempre.

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